Saturday, February 24, 2007

Audiobooks

Quando era miúdo nunca tive a oportunidade de ouvir um livro áudio, vou arriscar chamar-lhe assim em português. Quem como eu tem uma mãe que consegue imitar mil e uma vozes e transformar o fim do mundo na maior das histórias românticas, jamais precisaria de ouvir um livro para se fazer homem. No entanto, e apenas para aferir das potencialidades comerciais deste formato de livros, decidi pôr a rolar “A Fortaleza digital” de Dan Brown, enquanto parava e arrancava no trânsito. Conduzir é um perfeito desperdício de tempo e um livro áudio surgia aí, para além da pretensa prospecção de mercado, como uma boa forma de poder aproveitar algum tempo desses momentos quase perdidos.
Frustração. Um livro ouvido no carro não tem nada a ver. Nem no carro nem noutro local qualquer. O que nos entra por um ouvido sai-nos pelo outro e os livros áudio não lhe são excepção. Já não vivemos em tempo de nos darmos ao luxo de sermos tão superficiais.
Os livros tradicionais, ao contrário dos livros áudio, têm piada pelas pestanas que nos queimam. Ler um livro é, por isso, um acto só ao alcance de alguns. Mas não se fica por aqui! Porque é que um ponto final para mim não é uma vírgula para o autor do livro? É aqui que reside a sua graça, é aqui que se concretiza a sua liberdade. Um livro áudio não nos dá margem para mais nadinha. Está tudo ali. O ritmo é-nos imposto, a entoação também, os pontos as vírgulas os pontos e virgulas, também. E não há nada pior que as imposições. Confesso que me senti ansioso com a cadência respiratória que me foi obrigada no Fortaleza Digital contado. Deixei o carro numa pilha de nervos. Por isso os livros áudio deveriam ser proibidos nos carros ainda mais do que é proibida a conversação ao telemóvel. Hei-de ser capaz de provar através de uma amostra significativa que um livro áudio pode matar mais que uma mulher a conduzir enquanto arranja as sobrancelhas!
Embora fosse interessante conjecturar sobre o que poderia fazer pelo nosso trânsito a leitura de um momento íntimo, escrito em forma lírica, de um daqueles livrinhos eróticos tipo Laura ou Amanda, outras questões mais pertinentes devem ser levantadas nesta raspadura: Colocar em áudio uma história da branca de neve e os sete anões ou do capuchinho vermelho deve apresentar um grau de dificuldade de nível inferior, quando comparado com uma versão falada de uns “Os Lusíadas” de Luís Vaz de Camões ou de um, “As intermitências da Morte” de José Saramago, não? Ouvir a história dos porquinhos é uma coisa, ouvir um “Hei-de amar uma pedra” de António de Lobo Antunes deve ser outra completamente diferente, não é assim? As “estórias” áudio, porque são fáceis, fazem sentido, os livros não. Os jornais áudio, porque expõem a actualidade, vão fazer todo o sentido, os livros nunca. É por este conjunto de sensos e pela falta deles que me vejo, num futuro que me está muito próximo, sentado numa esplanada a seleccionar no meu MP3 um dos vários temas do, por exemplo, blog Bocados, a escolher ao calhas este texto, e começar a ouvir, na voz mais sensual que alguma vez um ser humano foi capaz de conceber: “Quando era miúdo nunca tive a oportunidade de ouvir um livro áudio, vou arriscar chamar-lhe assim em português…”. Um livro, na mesma esplanada e no mesmo formato, nem é bom pensar!

A google obrigou-me a mudar o meu blog para o formato google...

...E eu, claro, como era de (des)esperar, perdi-me na conversão, e fiquei sem o meu utilizador Bocados que passou a ser Temp. Depois, demorei um bocado a criar outro utilizador Bocados.

Resumindo: Embora o Temp seja o Bocados o Temp deixou de ser o Bocados, a partir do momento em que o próprio Temp convidou o Bocados a participar neste blog fazendo nada mais nada menos que o papel de Bocados. Conclusão, temos um papel velho para um Bocados novo.

Thursday, February 08, 2007

© Liliana

Ficar sem perguntas é ainda pior do que ter medo das respostas.
Eu, que já tive medo das respostas, fiquei perplexamente sem perguntas.